sábado, 24 de maio de 2008
Presidente da UNE defende entidade única de representação estudantil; leia entrevista
30/04/2008 - 17h56
Presidente da UNE defende entidade única de representação estudantil; leia entrevista
WANDERLEY PREITE SOBRINHO
Colaboração para a Folha Online
A gaúcha Lucia Stumpf, 25, preside a UNE (União Nacional dos Estudantes) desde julho do ano passado. Em entrevista à Folha Online Lúcia defende a existência de apenas uma entidade de representação dos estudantes. Para ela, a criação de outras entidades enfraqueceria o movimento.
"A UNE é forte exatamente porque é a única entidade. Dividir em outras instituições nos enfraqueceria", diz ela.
17.jul.07/Folha Imagem
Lucia Stumpf defende a existência de uma entidade única de representação estudantil
Stumpf afirma que não houve uma redução da adesão dos estudantes aos movimentos, mas sim alterações sociais. "O individualismo está presente no dia-a-dia da juventude. O estudante enxerga o aluno da carteira ao lado como concorrente, seja no cursinho ou na universidade."
Para ela, um dos desafios da UNE é atrair novos estudantes por meio da ampliação do debate. "Precisamos tratar de temas que os interessam, como a cultura."
Leia abaixo a íntegra da entrevista com Lucia Stumpf:
Folha Online - Como a UNE participou da reforma universitária que está tramitando no Congresso?
Lucia Stumpf - Depois de discutirmos com entidades de professores e de funcionários ligados à educação, apresentamos a nossa proposta aos deputados e ministros. Mas o que está em tramitação não é o projeto que foi aprovado naquela época. Agora, o que precisamos fazer é mobilizar os estudantes para tentar recuperar um pouco do texto original.
Folha Online - O que aconteceu com o projeto original?
Stumpf - A reforma que a gente defendia foi desfigurada pelo debate entre o Executivo e o Legislativo. Nós defendíamos a ampliação de vagas na universidade pública e a regulamentação da universidade privada. As particulares abusam na cobrança de mensalidade e não sofrem qualquer tipo de controle sobre a qualidade de ensino. Mas consideramos o projeto um avanço porque ele, pelo menos, discute temas exigidos pelos estudantes desde a década de 1970.
Folha Online - A existência de apenas uma entidade ligada às causas universitárias não limita o poder de discussão nessas horas?
Stumpf - Não. A UNE é forte exatamente porque é a única entidade. Dividir em outras instituições nos enfraqueceria. Existiria uma entidade para as faculdades de direito, outra para as particulares e uma terceira para as públicas. Ao mesmo tempo, há muita diversidade na UNE. Há representantes do PT, do PSOL, do DEM e do PSDB, por exemplo.
Folha Online - Como as várias correntes da UNE chegam a um acordo?
Stumpf - Nosso estatuto garante aos diretores o direito de se posicionar de forma distinta sobre o mesmo tema. Eu posso ser contra a atual reforma, mas outro diretor pode se posicionar a favor. O importante mesmo é que a maior parte das bandeiras defendidas pelos dirigentes da UNE são os mesmos.
Folha Online - Mas a maioria ligada à esquerda não ajuda?
Stumpf - O que é esquerda pra mim pode não ser pra você. Eu falo de bandeiras como luta pelo ensino público, pela regulamentação das universidades particulares.
Folha Online - O fim da ditadura não reduziu a visibilidade e poder de influência da UNE?
Stumpf - A UNE parece perder visibilidade porque estamos em um regime democrático e dividimos a atenção e as lutas com outras entidades. Mas a UNE é uma sobrevivente. Enquanto nossos dirigentes eram assassinados, presos e exilados, outros movimentos eram perseguidos e acabavam desorganizados. Por termos resistido, somos tão importantes hoje como no passado.
Folha Online - O movimento estudantil fez bem em participar da luta armada para combater a ditadura?
Stumpf - Naquela época uma série de organizações era obrigada a pegar em armas. Não vivi aquele momento, mas não tenho dúvidas de que foi uma opção justa porque quem passou por aquilo lutou contra um regime totalitário que desrespeitava os direitos humanos.
Folha Online - Por que a UNE participa de manifestações desligadas de assuntos estudantis, como o protesto contra a visita da secretária de Estado americana Condolezza Rice? Essa não é uma extrapolação de funções?
Stumpf - Todas as grandes questões nacionais devem passar pelos estudantes. Em toda sua história, a UNE lutou por temas de interesse do Brasil. Brigamos pelo petróleo nos anos 1940, pela redemocratização nos anos 1960 e contra as privatizações nos anos 1990. Agora temos de marcar posição contra as guerras de George Bush. Hoje ela é contra o Iraque, mas amanhã pode bater nas portas da América Latina.
Folha Online - Os estudantes de hoje são menos engajados do que no passado
Stumpf - Foi o mundo que mudou. O individualismo está presente no dia-a-dia da juventude. O estudante enxerga o aluno da carteira ao lado como concorrente, seja no cursinho ou na universidade. O mundo é individualista a começar pelas propagandas universitárias. Nossas lutas sociais enfrentam uma séria dificuldade de dialogar com a juventude, sempre atraída por outros valores.
Folha Online - É essa a grande dificuldade da UNE? Conseguir atrair mais estudantes?
Stumpf - Ela tem de ampliar o leque de debates. Precisamos tratar de temas que os interessam, como a cultura. Os Cucas (Centro Universitário de Cultura e Arte) é um núcleo criado para que os universitários produzam cultura. Também percorremos as universidades discutindo a legalização do aborto, das drogas e discutindo o uso de álcool no trânsito.
Folha Online - Qual é o futuro do movimento estudantil no Brasil?
Stumpf - Esperamos que os próximos 70 anos da UNE seja tão participativa quando nos primeiros 70. Acredito que o movimento estudantil estará ainda mais presente nas pautas estudantis e nacionais.
Folha Online - A senhora tem alguma pretensão política?
Stumpf - Não. Minha pretensão é continuar atuando nos movimentos sociais. Nenhum governo por si só é capaz de mudar alguma coisa. Ele só consegue se tiver pressão e cobrança por parte da sociedade organizada. Acho que posso contribuir mais dessa forma.
Folha Online - A UNE é comandada pelo PC do B?
Stumpf - Somos 85 diretores de todos os partidos políticos. O PC do B tem cerca de 18 membros. Não há nenhuma ingerência do PC do B em nossas atividades. Somos totalmente autônomos a ele.
Folha Online - Mas por que a maioria das lideranças que saem da UNE vão para o PC do B?
Stumpf - Realmente todos os presidentes são do PC do B desde a década de 1990. Eu mesma sou filiada a ele. Mas nenhum partido consegue ingerir sobre a UNE porque nossa diretoria é proporcionalmente dividida entre diferentes partidos e dirigida de acordo com o que delibera os estudantes em nossos congressos. Minhas decisões são dirigidas pelos congressos e não pelas orientações do meu partido.
Folha Online - Por que o PC do B sempre fica com a presidência da UNE?
Stumpf - É porque PC do B é o partido político que mais trabalha com a juventude. A União da Juventude Socialista, dirigida pelo PC do B, é a maior entidade juvenil do país com 200 mil filiados. Como essas pessoas participam ativamente dos grêmios nas universidades, eles acabam muito presentes na UNE.
Folha Online - Passar pela UNE credencia as pessoas a atuarem na política?
Stumpf - Sim porque fazer parte da UNE é um grande exercício de democracia. Nela são tratados os mais diversos assuntos, que vão da reforma da universidade a temas como aborto e drogas. Como essas discussões movimentam todos os partidos, a UNE acaba se tornando a maior escola de democracia do país. Não é a toa que ela sempre forma grandes políticos.
Folha Online - Como vê a Conlute, uma entidade de oposição à UNE?
Stumpf - Não reconhecemos como uma entidade que representa os universitários. Ela é formada por quem não quer ver as transformações que estão em curso e só pensa em dividir o movimento estudantil. Ela vai morrer à mingua como o SDE (Social Democracia Estudantil), uma alternativa à UNE proposta pelo PSDB em 2001 que também não deu certo.
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