quarta-feira, 21 de maio de 2008

CARTA ABERTA DO MSU, MOVIMENTO DOS SEM UNIVERSIDADE, AO

Brasília, 13 de maio de 2008.
CARTA ABERTA DO MSU, MOVIMENTO DOS SEM UNIVERSIDADE, AO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, CONTRA DUAS AÇÕES DIRETAS DE
INCONSTITUCIONALIDADE (ADIN 3.330 E ADIN 3.197) E EM DEFESA DA DEMOCRACIA, DO DIREITO À UNIVERSIDADE, DA ESCOLA PÚBLICA, DOS POVOS NEGRO E INDÍGENA BRASILEIROS.


Ao Exmo Ministro Presidente do STF
Sr. Gilmar Mendes
A defesa da integridade do PROUNI e das cotas para formandos(as) em escolas
públicas, para negros, negras e indígenas dialoga diretamente com a passagem dos 120 anos
de abolição inconclusa no Brasil e com os duzentos anos de implantação dos cursos
superiores públicos no país.
“O Brasil é o país do futuro”, diziam uns há muito tempo. Outros, como o
economista Keynes, enxergam neste tipo de raciocínio um risco. “No longo prazo
estaremos todos mortos”, afirmava Keynes anos 1930 ao pugnar por mudanças no
paradigma econômico dominante e com esta visão ajudar a economia mundial a sair da
crise da bolsa de 1929.
Mutatis mutandis, no Brasil de 2008 há quem defenda com unhas e dentes o atual
sistema hegemônico de vestibular para o acesso ao ensino superior, seus pressupostos, sua
intencionalidade, seus resultados, sua famigerada indústria, sua cota para ricos, brancos e a
escola privada nas principais carreiras e cursos, o que chega a reservar em alguns casos,
como medicina, em certas universidades federais, mais de 80% das vagas públicas para
extratos sociais privilegiados da sociedade com uma das piores distribuições de renda do
mundo. Então, as cotas já existem, mas apenas para esses privilegiados. É este o paradigma
carcomido de injustiças. Sua defesa mais explícita está no manifesto de setores
empresariais da indústria dos vestibulares e seus seguidores, entregue no dia 30 de abril de
2008 para o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, com
grande alarde nos meios de comunicação.
Ora, o paradigma atual é um dogma das elites nacionais em franca ofensa à razão, à
justiça social e à constitucionalidade dos direitos sociais no Brasil garantidos pela
constituição cidadã de 1988.
Para questionar e pugnar por mudanças no paradigma dogmático dominante no
vestibular brasileiro e para defender a integridade do PROUNI e das políticas de cotas para
negros, negras, indígenas e para a escola pública é que são estas simples letras.
Dizia Milton Santos: “a missão do homem de ciência é arriscada por definição.
Nenhum risco, porém, é tão grave quanto o de formular uma verdade científica como uma
certeza eterna. Na engrenagem atual do trabalho científico, esse risco é tanto maior quando
certos pensadores e pesquisadores, chegando a resultados válidos após uma reflexão
freqüentemente longa, passam a utilizá-los como verdadeiros dogmas, toda discussão se
fazendo em termo de validez ou não do postulado, o que substitui a procura dos corretivos
impostos pela própria evolução das coisas”.
Por isto, o paradigma da reserva de vagas para a escola pública, negros, negras e
indígenas não tem pretensão de eternidade. É política pública de curto prazo, para reparar e
superar situações esquizofrênicas, vexatórias, humilhantes, empertigadas de injustiça, como
é o fato da maioria dos trabalhadores e seus familiares não terem acesso à universidade
pública no Brasil, que é custeada com o dinheiro dos impostos de todos os brasileiros. Não
raro a ampla maioria no Brasil se vê sob o peso de uma situação ridícula e absurda: os
trabalhadores pagam para estudar no ensino superior, ao passo que as elites têm suas vagas
garantidas nas universidades públicas. Não queremos mais cidadania restringida, mas
cidadania plena.
Se o projeto abolicionista de Nabuco e da luta histórica do movimento negro fez
uma grave fenda na escravidão, os dois parágrafos da lei da abolição de 1888, não geraram
eqüidade social. O mesmo raciocínio vale para o povo indígena, massacrado pelos
colonizadores.
Nenhuma tinta argumentativa ancorada no idealismo da “democracia racial”, no
higiênico raciocínio da genética atual ou no perverso interesse econômico e comercial
camuflado, fugirá com a memória dos acontecimentos passados na história do Brasil.
Ademais, o PROUNI e os exemplos de discriminação positiva das universidades do
Rio de Janeiro e alhures no Brasil são responsáveis por maior coesão social no país. No
estrito sentido de que mais brasileiros comungam oportunidades iguais.
Por último, reforçamos que as conquistas das lutas sociais dos SEM
UNIVERSIDADE no Brasil não caíram do céu ou foram entregues por Papai Noel. Os
cursinhos populares, as isenções conquistadas das aviltantes taxas dos vestibulares, a
criação do Sistema Nacional de Bolsas - o PROUNI; as cotas para a escola pública, negros
e indígenas são frutos da luta social com fartos registros na história brasileira.
Sobre esse item queremos desapontar os dogmáticos do velho paradigma dominante
nos sistemas de vestibulares brasileiros: não ajam como os romanos mantendo o povo
brasileiro dividido para sustentar privilégios. Não joguem uns contra os outros, porque a
população não é joguete e tem projeto de destino e de felicidade.
A escola pública e sua diversidade, os negros e negras, os indígenas pedem
passagem para a universidade pública. Esta é a senha popular da justiça social, do direito,
da constitucionalidade das cotas para os não-privilegiados.
MSU, Movimento dos Sem Universidade.

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