sábado, 5 de abril de 2008

DEPOIMENTO DE MARCO MACIEL

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
PROJETO “O Debate da relação educação e sociedade no movimento estudantil das tradicionais escolas de engenharia de Ouro Preto e Recife”.

DEPOIMENTO DE MARCO MACIEL
á
OTÁVIO LUIZ MACHADO


ENTREVISTADOR: OTÁVIO LUIZ MACHADO
DEPOENTE: MARCO MACIEL
LOCAL: BRASÍLIA
DATA: 29/01/2004


OTÁVIO LUIZ MACHADO: 29 de janeiro de 2004. Estamos aqui com Marco Maciel para uma entrevista. Primeiramente gostaria de pegar os seus dados pessoais para registro. Seu nome completo?

MARCO MACIEL: Marco Antonio de Oliveira Maciel.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: qual sua profissão?

MARCO MACIEL: eu sou advogado, filiado à OAB, embora esteja há muito tempo afastado do exercício da profissão, porque eu sempre entendi que na hora que eu tenho um mandato público e eu exerço uma profissão pode haver um conflito de interesses. Eu quero preservar a minha total independência.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: você então não exerceu outra função?

MARCO MACIEL: eu não tenho outra função a não ser a função pública. Eu não faço outra coisa a não ser isso. Então, eu sou da OAB, mas afastado nessa condição.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: qual sua data de nascimento? E local?

MARCO MACIEL: 21 de julho de 1940, em Recife-PE.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: quando começou a estudar?

MARCO MACIEL: eu comecei o meu curso primário no Recife e....

OTÁVIO LUIZ MACHADO: e a nível universitário?

MARCO MACIEL: eu entrei na Faculdade de Direito em 1959. E me formei em 1962.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: e a condição e atuação dos seus pais?

MARCO MACIEL: o meu pai é formado em Direito. Ele foi promotor, juiz, consultor-geral do Estado, Prefeito da capital e duas vezes deputado federal. E era do PSD. E entre outras coisas que falavam, muita gente dizia assim: “Marco Maciel era filiado”. Eu nunca fui filiado a partido político. Eu separava muito a coisa do estudante – que era uma condição – do partido político. Quer dizer, era minha cabeça naquela ocasião. E não me arrependi. Então estudante era um cara político bem atualizado. Meu pai foi presidente do PSD em Pernambuco, mas eu não participei do PSD. Não que eu tivesse divergências com meu pai, pelo contrário. Eu achava que o estudante não pode ter filiação partidária, porque no movimento estudantil deve ser o representante dos estudantes e não deve ter nenhuma limitação para agir. Bom, isso era a minha cabeça. Eu não me arrependi de ter adotado esta postura. Mas hoje muita gente questiona na UNE a disputa dos partidos participando, tudo bem. Mas naquela ocasião eu queria preservar a minha total liberdade de servir o interesse do estudante e não de segmentos partidários que representam tendências legítimas, mas tendências que formavam interesses de partidos naquele momento.


OTÁVIO LUIZ MACHADO: poderia me repassar rapidamente o quadro da Faculdade de Direito quando o senhor começou a estudar? Quais os pontos positivos e negativos da Faculdade?

MARCO MACIEL: A Faculdade de Direito do Recife é uma escola famosa. E eu fiz vestibular e concorri. Foram aprovados dezessete. Eu não fiz aqueles cursinhos que se faziam de pré-vestibular. O que eu achava é que tinha um excelente corpo docente. Muitos que saíam foram ministros do Supremo e outras coisas. Tinha uma excelente biblioteca, que era uma das maiores da época no Recife. E vivemos, todavia, no segundo ano um problema sério com o diretor da Escola, que era um grande civilista. Inclusive lia muito bem alemão. Mas nós tivemos um problema porque achávamos que ele era muito ausente. E nesta ocasião eu já era Presidente do DCE. E o Presidente do Diretório era Antônio Augusto Carneiro, que inclusive faleceu de um câncer de fígado ou uma coisa dessas assim. Mas foi uma coisa muito rápida. Ele era um homem mais velho do que eu. Aí ele fez uma greve. E essa greve foi que deu lugar a Jânio deslocar as tropas federais pra lá. Não sei se te falaram. Foi em 1961. E acredito que por trás daquele deslocamento de tropas houve inclusive interesse de Jânio para adquirir poderes excepcionais. De alguma forma isso foi confirmado com a renúncia dele. E depois o Exército invadiu a Escola por ordens de Jânio. O Ministro era o Tinoco. Invadiram a Escola e nós fomos retirados pelo Exército de dentro da Escola. Eu inclusive, que era o Presidente do DCE, mas o Presidente do Diretório e umas trinta ou quarenta pessoas ficaram, porque muitos resolveram não sair antes e tudo. Mas a turma saiu. E depois até uma vez houve uma coisa curiosa. O Comandante do IV Exército era o Costa e Silva, General de Divisão, e aí mandou chamar a gente desesperado. Mas depois nós vimos as causas. A greve daqui estendeu um pouco. Apareceu o Diretor, apareceu o Reitor. Depois que ele soube da nossa razão concordou. Ele concordou. Foi até interessante isso.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: na Faculdade de Direito o senhor identificava algum problema ou dificuldade da Escola de manter o espírito desta tradição com uma perda do antigo vigor ou de decadência?

MARCO MACIEL: ainda não. Ainda tinha aquelas coisas de concurso de cátedra persistindo, que até saía nos jornais. Então era uma coisa interessante. Tinha os concursos de oratória. Tinha também as semanas jurídicas. Esse Diretório Acadêmico era muito presente. Depois tinha um concurso antes das provas orais e a argüição dos candidatos das cátedras. Na época da cátedra vitalícia era aquele negócio importante. Quando havia alguns casos, como quando o governo americano mandou matar um prisioneiro, que era um criminoso que ficou famoso. E nesse dia que ele foi morto na cadeira elétrica aconteceu um debate a noite sobre pena de morte. Naquela época o cara que era estudante universitário era de fato uma elite. Hoje o país cresceu em todos os aspectos e aumentou as oportunidades de acesso.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: enquanto estudante quais cargos ocupou inicialmente?

MARCO MACIEL: no plano secundarista eu não participei. E a minha vida política e universitária começou no primeiro ano quando eu cheguei. Nós elegemos o grupo ao qual eu pertencia e que depois eu passei a liderar, que me designou para ser diretor da revista da faculdade. Era uma revista que vinha do Império. A Faculdade de Direito do Recife, juntamente com a do Largo do São Francisco, é a mais antiga do Brasil, fundada em 1827.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: são as duas mais antigas instituições de ensino superior.

MARCO MACIEL: exatamente. Aí essa revista, que era uma revista do Império, tinha sofrido interrupção integral, e eu retomei essa revista. No segundo ano aí eu me elejo Presidente do Diretório Central dos Estudantes da própria Universidade Federal de Pernambuco. E passei aí ser membro do Conselho Universitário. E aí tem um problema curioso, porque eu não tinha maioridade absoluta ainda, porque a maioridade absoluta só com vinte e um anos. Aí eu fui Presidente do Diretório Central dos Estudantes e me reelegi Presidente do Diretório Central dos Estudantes. Então eleito em 1960. E reeleito em 1961. Em 62 fui eleito, por eleição direta, para a UEP (Uniao dos Estudantes de Pernambuco). Votaram naquela época – é o que se pode calcular – 15 mil estudantes. Mas eleição direta. E me elegi presidente da UEE, União Estadual dos Estudantes. Aí eu já estava do quarto para o quinto ano e consegui eleger o meu sucessor, que foi o Doutor José Tinoco Machado de Albuquerque, que foi deputado estadual e federal e é médico atualmente. Aí terminou a minha vida universitária enquanto universitário. É lógico que aí participei de uns congressos da UNE, especificamente o de Santo André. Basicamente é isso. Não tive uma participação muito forte na UNE.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: mas a UEP lhe condições de quase chegar à UNE?

MARCO MACIEL: Eui muito chamado assim, mas não tive uma participação maior. E devo dizer que algumas pessoas me procuraram dizendo para eu ser candidato da UNE quando estava terminando o mandato na UEP. Aí eu disse: “não vou ser candidato, porque o concluinte não pode ser candidato. Se de fato toma posse em julho e se em dezembro conclui o curso, então na realidade é uma coisa complicada porque ele vai ficar a metade do tempo só”. Então disseram: “você podia fazer um vestibular numa outra escola e aí ficava o primeiro ano nesta escola”. Aí eu me recusei a isso. Eu era contra aquelas pessoas que ficam naquela condição. E eu não gostaria de adotar esta conduta chamada de “estudante profissional”. Não sei se você chegou a ouvir falar da figura do “estudante profissional”. Eu estava ali para estudar. Eu acho que o estudante não é classe, é condição. Aí eu não vou discutir esses aspectos. No meu conceito é que estudante é condição, e não classe.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: e a questão da sociedade estar se modernizando e a universidade não estar acompanhando?

MARCO MACIEL: não sei se isso era corretamente, porque a universidade naquela ocasião tinha uma liderança muito grande. Agora, em certo momento também o modelo universitário pode ter concorrido para a universidade enquanto uma torre de marfim. Em certo momento a universidade começou a se fechar nas suas pesquisas, nos seus estudos. Aí vem aquele papel da universidade enquanto extensão social, quer dizer, enquanto inserção da universidade no meio social em que ela se situa. Esse é um grande debate que já havia.

OTÁVIO LUIZ MACHADO: e a questão da radicalização do movimento, da disputa entre direita e esquerda, o embate inclusive por meios violentos?

MARCO MACIEL: eu acho que a radicalização não é uma coisa boa. Eu acho que tem que se entender melhor. E sobre uma dada circunstância específica que nos podemos fazer e atuar. E é isso que eu tenho procurado realizar na minha vida pública.

Um comentário:

Anônimo disse...

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