quinta-feira, 25 de junho de 2009

Artigo O PATRIMONIALISMO DA UNE E O ESTADO BRASILEIRO: CAPÍTULO CONGRESSO NACIONAL VERSUS INTERESSE PÚBLICO: CAPÍTULO CONGRESSO NACIONAL VERSUS INTER


O PATRIMONIALISMO DA UNE E O ESTADO BRASILEIRO: CAPÍTULO CONGRESSO NACIONAL VERSUS INTERESSE PÚBLICO

Por Otávio Luiz Machado

Coordenador de Atividades do PROENGE - Estudos sobre Juventude, Movimentos Estudantis, Cidadania, Direitos Humanos e Educação

E-mail: otaviomachado3@yahoo.com.br

tel: (81) 9715-7846

A UNE busca extrair do Estado tudo que pode, mas sem a devida contrapartida para a sociedade brasileira, pois o público foi aos poucos se tornando privado a partir de cada recurso público recebido pela entidade.

Com uma atividade nada transparente, composta de uma direção arrogante, com sentimento do inalcançável, do fora do comum e do excepcional, o que a UNE propõe – com o patrocínio do Governo – é inconstitucional, pois não seguem os parâmetros mínimos da administração pública. Trata-se do pedido de recursos públicos para construção da sede da entidade em área nobre da cidade do Rio de Janeiro. A antiga sede foi incendiada em 1964 por membros de uma direita radical, mas a UNE a todo custo tenta jogar a conta para o Estado, como se naquilo houvesse responsabilidade estatal. A conta é um verdadeiro bilhete premiado: R$40 milhões.

O projeto de Lei 3931/2008 tramita no Congresso, o que visa repassar tais recursos, mesmo que a entidade recebedora dos recursos não possua condições mínimas para o seu recebimento, caso fossemos tomar apenas o período de 2004 até hoje como base. Vamos aos fatos.

Com o nome de “História da U.N.E.” (mais conhecido como “Memória do Movimento Estudantil”), em 2004 a UNE faz parceria com a Fundação Roberto Marinho da Rede Globo, cujos recursos totalizam R$3,3 milhões. Com outros projetos “menores” somando-se a esse com a justificativa de resgate histórico do movimento estudantil, a UNE foi beneficiada por valores próximos a R$5 milhões. Mas mesmo assim nada de concreto se alcançou, pois:

1) Foram desviados recursos públicos que poderiam ter sido utilizados para o resgate da história do movimento estudantil para destacar nomes recentes que estão envolvidos com o PC do B, em detrimento de figuras que realmente fizeram parte da história do movimento estudantil;

2) - Utilizou-se de recursos públicos de uma lei de incentivo à cultura para promover atos políticos em cidades como Olinda-PE, Nova Iguaçu-RJ e Belo Horizonte-MG com o pseudo argumento de produzir uma campanha de arrecadação de documentos para o seu projeto;

3) Produziu um livro “Memórias estudantis: da fundação da UNE aos nossos dias” (de Maria Paula de Araújo, 2007) – que deixa muito claro o quanto a entidade deixou de contemplar a história do movimento estudantil brasileiro a partir da UNE, para relacioná-la apenas aos interesses atuais do PC do B na direção da entidade. Esse livro poderá ser pago pelos leitores a um custo de R$60,00;

4) O projeto Memória do Movimento Estudantil teve como objetivo exclusivo ser o canal de captação de mais recursos para a UNE;

5) O princípio do acesso aos produtos do projeto não se concretizou, embora os produtos são questionáveis.

A UNE só não conseguiu esconder a história do movimento estudantil dos estudantes porque muitos trabalhos sérios são realizados nas nossas universidades nesse momento. E nem conseguirá, pois documentos inteiros, entrevistas, fotografias e até livros agora estão disponíveis na internet, inclusive sendo cada vez mais acessados e utilizados pela sociedade brasileira, que descobre a verdadeira data de fundação da UNE (1938), que o incêndio à sede da UNE foi produzido por golpistas de direita e não pelo Governo em 1964, bem como tantos outros aspectos que o PC do B na UNE busca insistentemente esconder dos estudantes.

Não aceitaremos que esse grupo ligado ao PC do B tente mais uma vez monopolizar e privatizar a documentação do movimento estudantil. Se a majoritária da UNE escolheu vender-se por dinheiro, então é uma escolha própria. Não permitiremos que ponham à venda a memória do movimento estudantil, pois o patrocínio de R$40 milhões do Estado com a justificativa de preservação é facilmente derrubada, pois o critério público deve prevalecer no caso de questões que envolvem patrimônio cultural do país.

Há todas as provas documentais de que a majoritária da UNE quis esconder a história do movimento estudantil do conjunto dos estudantes, bem como utilizou recursos públicos para promover o grupo que consegue ficar por lá na maior tranqüilidade “apenas” vinte anos seguidos. A eles interessa apenas enfraquecer o movimento estudantil para que o seu grupo se fortaleça e continue na direção da entidade.

As UEEs, que são os braços estaduais da UNE, por exemplo, conseguem eleger seu (ou sua) Presidente com poucos votos do conjunto dos estudantes de cada Estado. Só a lógica da manipulação permite que em Pernambuco o (a) presidente seja eleito (a) com 212 votos, Paraná com 105, São Paulo com 255, Amazonas com 98 ou Santa Catarina com 105 votos, que é um total inferior a qualquer curso de graduação de nossas universidades, mas que dizem representar os estudantes de todo um Estado com isso.

O ato em “defesa” da Petrobras está dentro desse espectro patrimonialista, pois é a estatal que financiou seu projeto memória do movimento estudantil, que é fruto de recursos nada utilizados em proveito do povo brasileiro. Quanto ao Senado, o silêncio continua desde o episódio de Renan Calheiros. Sarney não tem condições mais de ser um Senador da República, nem muito menos Presidente.

Se a UNE fosse conduzida por gente séria, certamente seria uma entidade que faria a diferença. A impunidade que beneficia figuras desprezíveis como Renan Calheiros e José Sarney, os atuais nomes mais poderosos da República depois do Presidente da República, contou com a ajudinha da UNE.

O recebimento de recursos públicos para fins privados pela UNE, em concomitância com o apoio irrestrito ao Governo Federal e a implacável perseguição aos grupos opositores inclusive com a chancela estatal, fere em cheio a dignidade humana dos cidadãos com visões diferentes, o que vai de desencontro à Constituição Federal e os princípios internacionais de direitos humanos.

Como é fato, interessa à UNE defender apenas os interesses pessoais de sua diretoria, como no ato contra a CPI da Petrobras ou na utilização da memória do movimento estudantil apenas para angariar recursos públicos, omitindo-se em relação ao resto, então é uma entidade pública que não está a serviço do Brasil mas de sua própria reprodução.

Pior que ficar na mão de Sarneys, Renans, Malufs ou Jader Barbalhos, o pior para a UNE foi vender-se a tanta gente com o seu silêncio covarde e mesquinho, emprestando o que é mais sagrado, que é a sua História. Nomes como Gustavo Petta e Lúcia Stumpf jamais serão esquecidos.

Ao final do ciclo de aprovação da maior compra de uma entidade estudantil na história do Brasil (juridicamente não terá como haver o repasse do dinheiro), com a assinatura do presidente da República, serei o primeiro a novamente a manifestar contra tal ato, dessa vez contra o Estado Brasileiro, pois enquanto a UNE teve recursos públicos de cerca de R$5 milhões para reconstituir a história do movimento estudantil e nada fez de concreto – a não ser beneficiar pessoalmente o seu grupo ligado ao PC do B e a maior rede de televisão do Brasil – , nós construímos o principal projeto de resgate da memória do movimento estudantil com 0,0001% do que eles utilizaram.

A direção majoritária da UNE vai aprender que não se pode brincar com recursos ou com a inteligência do povo brasileiro, pois além de barrar a liberação dos 40 milhões, ainda exigir-se-á o ressarcimento dos outros milhões de reais utilizados de forma desonesta.

Também pesará contra o Estado Brasileiro o combate desumano aos opositores do projeto educacional do Governo, para o qual foram liberados recursos para a UNE que foram utilizados nisso, sem falar na construção de uma rede de apoio mútuo entre Governo e UNE que feriram a dignidade humana dos estudantes envolvidos no movimento estudantil que quis debater e não foi ouvido.

Com isso, a UNE irá aprender três lições:

1) Que ao invés de fazer parceria com Fundação da Rede Globo, não se podem deixar as universidades em último plano;

2) Que cabe ao Estado cuidar da memória e do patrimônio cultural brasileiro;

3) Que o compadrio, o fisiologismo e o patrimonialismo não são compatíveis com o Estado Democrático de Direito.

A UNE, ao fazer a roda girar para seus próprios interesses, torna-se uma entidade não mais a serviço do Brasil. A partir do momento em que um grupo político passa a receber vultosos recursos públicos sem a devida contrapartida social, utiliza-se desse poder para ferir a dignidade coletiva ou individual dos estudantes que discordam das posições da diretoria da UNE e sendo taxados não mais como adversários, mas inimigos políticos ferem-se os direitos humanos. E isso não é aceito por nenhum País que coloca a democracia como valor supremo.


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