quarta-feira, 9 de julho de 2008

Ocupação de uma reitoria: Tomada 1 – Juventude e Movimento Estudantil na novela da Globo


FONTE: http://www.uff.br/obsjovem/mambo/index.php?option=com_content&task=view&id=384&Itemid=23

Quarta-feira, 9 de Julho de 2008
Ocupação de uma reitoria: Tomada 1 – Juventude e Movimento Estudantil na novela da Globo

Por Guilherme Brandt de Oliveira - estudante do curso de Pedagogia da UFF
24 de November de 2007

“Eu acredito é na rapaziada

Que segue em frente e segura o rojão,

como é que não...”

A apropriação da música de Gonzaguinha não poderia ser mais indevida. Ao escrever a música, o autor pretendia elogiar e se colocar ao lado da juventude que luta, principalmente a organizada no movimento estudantil. Entretanto, a forma como a novela “Duas Caras”, de Aguinaldo Silva, que tem a música de Gonzaguinha como tema de abertura, vem tratando essa juventude não é nada elogiosa
Para contextualizar o que aconteceu nos episódios da semana de 5 a 9 de novembro, vejamos o resumo oferecido pelo próprio site da novela:
Invasão vira caso de políciaEntoando gritos de guerra e segurando cartazes, os estudantes, comandados pelo aluno Rudolf, começam a engrossar a manifestação pela escolha do reitor por voto direto. Branca [personagem de Suzana Vieira, que assume o lugar de seu falecido marido como presidente do conselho de administração de uma universidade particular, a Universidade Pessoa de Moraes] reage com dureza e diz que os protestos não são legítimos. Os professores, principalmente Heriberto e Ignácio Guevara, fazem jogo duplo: ao mesmo tempo em que fingem estar ao lado dela, incitam os alunos. [...] Com tantos impasses, o protesto começa a ganhar grandes proporções. Os alunos e outras pessoas chamadas para agregar a multidão decidem invadir a reitoria. Reviram gavetas e armários, destroem livros, fazem uma verdadeira baderna.
A Globo vem, já não é de hoje, construindo o discurso de que movimento social trata-se de baderna, crime. O específico aqui é a forma como se retrata a juventude organizada no movimento estudantil.
Como que se dá isso? Como visto na sinopse, os alunos são incitados pelos professores Heriberto e Ignácio Guevara (personagem que remete à Lula e a Che). A construção dos personagens dos alunos, principalmente do personagem Rudolf remete a figuras absolutamente unidimensionais, de forma que o jovem líder do movimento se mostra incapaz de pensar, quase tudo que diz são bordões e frases feitas. Assim, não há um momento em que consiga reagir de forma apropriada a uma situação que se apresente. Dessa forma, a representação social que se pretende passar é que esses jovens de movimento estudantil são manipulados por professores esquerdistas mal-intencionados.
Além de tudo, os jovens são baderneiros, afirma a novela que mostra jovens estudantes como caso de polícia. Eles entoam “cantos de guerra”, rasgam livros, picham paredes, queimam pneus. A construção é feita de tal maneira que a chegada da polícia é considerada bem-vinda e, por mais que os estudantes se abram para o diálogo, a personagem Branca se recusa a fazê-lo, exigindo que a polícia retire aqueles que ela considera criminosos. Em dado momento, a personagem afirma: “Invasão de propriedade privada é crime! Não vou compactuar com isso, nem ser cúmplice de um crime em que a vítima sou eu. Não tem diálogo, meu irmão.” O recado é claro: por que ela, Branca, rica, adulta, haveria de ter de negociar com jovens estudantes se pode mandar a polícia bater neles? Posteriormente, ela afirma, inclusive, que poderia ter negociado, mas precisava manter sua autoridade naquele momento. Ou seja, que mal há em alguns jovens apanharem se é para reforçar a autoridade estabelecida?
Quem conhece a realidade do movimento estudantil sabe que a imagem mostrada na novela não é correspondente ao que ocorre. Quando há ocupações, as lideranças orientam para se tomar cuidado com o patrimônio, principalmente porque têm ciência que a grande mídia sabe como pegar um caso isolado, mesmo que acidental, para alardear como se fosse o usual.
Após a desocupação, feita com violência pelo Batalhão de Choque da PM, os jovens encontram-se perfilados, cabeças baixas no corredor e ouvem a lição da pessoa mais velha (no caso, Branca), que vem lhes ensinar que não devem perder seu tempo com besteiras como aquela e sim estudando. Nesse momento, fica explícita a opressão etária, representada pela imposição da autoridade de Branca sobre os jovens, como que dizendo que seguir a seus colegas os levará a destinos ruins, enquanto ouvir a ela lhes dará o bom caminho.
Em dado momento, o autor grita sua orientação política através de sua personagem. Quando Branca vê os livros rasgados no chão, ele afirma: “eles rasgam livros! Se isso é ser de direita, então eu sou de direita!”. Em outra, um determinado professor chora pela destruição de sua pesquisa, numa tentativa de remeter à destruição de um laboratório de pesquisa sobre transgênicos da Aracruz Celulose pelo MST. Finalmente, quando os estudantes reunidos avaliando a ocupação, o personagem Rudolf afirma “às vezes é preciso recuar um passo para avançar dois, como diria o camarada Lênin”. Nisso, Aguinaldo, digo, Branca irrompe e diz: “Lênin não passa de uma múmia empoeirada!”
Analisando alguns comentários na comunidade “Duas Caras” no Orkut (
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=26182832), pode-se perceber que a Globo consegue, em algum nível, a construção da representação social desejada. No tópico “Aluno que provoco a rebelião dos alunos (Odeio)”, todas as opiniões (quatorze, no total) condenam a rebelião dos estudantes. Eis algumas delas (todos os comentários foram copiados ipsis literis, com as formas de linguagens comuns da internet e erros em relação ao português formal):
· “rebelde sem causa.”
· “retardadisse mental.. isso eh eles aprovaram q saum 100% débis !”
· “eu achei desnecessario aquela rebelião toda só por que os alunos não vão votar pra eleger um reitor, isso foi um exagero”
“A rebelião foi ridícula msm e pela 1º vez, tenho q admitir: A Branca arrasou!!!!!!!!!! passou por cima daqueles bardeneiros que no fim de tudo, eh bem capaz de terem q pagar mais caro pela unirvesidade e pelos livros q eles msms destruíram. Aff, eh com atitudes assim q a educação no Brasil vai pro fundo do barril.”
Realmente, não é de se estranhar que a Globo queira construir esta dada representação social. Afinal, trata-se da empresa que tem o histórico que tem. Ela sabe do que é capaz a juventude, principalmente quando organizada. Construir uma opinião de que jovem organizado é baderneiro e está obedecendo algum adulto com outras intenções, em poucas palavras, lhe é positivo. E o faz com absoluta questão de dar um tapa na cara, usando a música que tantas vezes os jovens utilizamos como hino, expropriando-o. Cabe aceitar o desafio e recuperar o que é da juventude: hino e verdade.
“Eu ponho fé é na fé da moçadaQue não foge da fera e enfrenta o leão...”
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As idéias e opiniões expressas nos artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Conselho Editorial do Observatório Jovem do Rio de Janeiro/UFF
Serviço do Observatório Jovem:
Assista os trechos da novela sobre o tema do artigo:
Branca encara os alunos
http://video.globo.com/Videos/Player/Entretenimento/0,,GIM752107-7822-BRANCA+ENCARA+OS+ALUNOS,00.html Estudantes invadem reitoriahttp://video.globo.com/Videos/Player/Entretenimento/0,,GIM752118-7822-ESTUDANTES+INVADEM+REITORIA,00.html

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