domingo, 6 de abril de 2008

Depoimento de Jorge Batista

TRANSCRIÇÃO DA FITA MAGNÉTICA GRAVADA NO PROGRAMA LEVADO AO AR PELA RÁDIO ITATAIA, DE BELO HORIZONTE, ÀS 12: 00 HORAS DO DIA 29 DE MARÇO DE 1968, COM AS DECLARAÇÕES DO ESTUDANTE JORGE BATISTA, PRESIDENTE DO DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DE MINAS GERAIS

REPÓRTER: Nós vamos trazer ao nosso microfone o Presidente do DCE, universitário JORGE BATISTA, que interpreta o pensamento do estudante mineiro em relação aos acontecimentos que envolveram a passeata de estudantes realizada, ontem, no Calabouço, na Guanabara.
JORGE BATISTA: Senhores e Senhoras, segundo informações que nos chegam, já efetivas, um operário e três estudantes foram ontem assassinados na Guanabara. O que é que faziam, os companheiros estudantes da Guanabara? Reivindicavam, como reivindicamos hoje em todo o país, uma Universidade livre, pública, gratuita e aberta ao povo, Universidade não fechada, não em crise, mas Universidade aberta e capaz de atender aos interêsses da sociedade. Nós achamos que a êsse crime corresponde uma violência e corresponde uma agressão criminosa e brutal. Achamos que nêsse crime, sobretudo, corresponde à ofensiva atual da política de govêrno para Universidades e da política do govêrno para todos os setores da sociedade estadual. Achamos que êsse crime está aí. É a comemoração do 4º aniversário do golpe de estado covardemente levado a efeito nêste país há quatro anos. É a comemoração pelo sangue, é a comemoração pela violência. Mas nós entendemos que não nos cabe calar ante êssa violência, que a essa ofensiva exige de nós uma resposta em têrmos do contra-ofensiva. Nós achamos que não vão ser os fuzís, que não vão ser as metralhadoras, que não vão ser as balas, que não vão ser qualquer arma de morte da ditadura do govêrno anti-povo atual que há de calar nossa voz, que há de barrar nossa ação. E entendemos mais, que essa questão não se põe apenas para o estudante mineiro, mas, para todos os estudantes de todo o Brasil, em Têrmos de necessidade de uma solidariedade ativa aos companheiros da Guanabara. Entendemos que essa solidariedade não pode ficar apenas nas palavras, nas palavras ditas ao povo, mas há de ficar também na ação levada a efeito concretamente para o povo entender, para o povo ver e participar efetivamente do nosso protesto e da nossa denúncia. Nós entendemos mais que todo o povo há de participar efetivamente do nosso protesto e da nossa denúncia. Nós entendemos mais que todo o povo há de participar do movimento de resposta a essa agressão, porquê a todo o povo interessa a liberdade de impedir no seu sentido mais profundo e radical, a todo o povo interessa aquilo que hoje que fundamentalmente prega e busca no movimento estudantil brasileiro. A todo o povo interessa Universidade livre, pública, gratuita e aberta ao povo. Nós entendemos que ante êsses fatos, vão chegar nos jornais, vão chegar nas televisões, vão chegar em tôdas as vias de comunicação, palavras de ordem do Secretário de Segurança, palavras de ordem das autoridades "entre aspas" do govêrno, tentando apelar para os senhores pais, tentando apelar para as senhoras mães de famílias, tentando apelar para todos os setores da sociedade no sentido de que não permitam, de que não aconselhem a seus filhos irem às ruas, no sentido de que não permitam a resposta a essa agressão. Nós chamamos a atenção, então, da nossa parte. O Movimento Estudantil chama a atenção de sua parte para os senhores pais, para as senhoras mães, para todos os setores da sociedade. Perguntamos, o que é que podemos fazer em face disso? E respondemos: devemos nos calar, devemos nos largar em nossas salas de aula? Devemos nos largar nas Universidades, ou em nossas residências, enquanto companheiros nossos, irmãos nossos foram ontem assassinados violentamente na Guanabara, por uma polícia orientada, por um govêrno orientado, por uma ditadura orientada? Nós achamos que não. Achamos que o nosso dever históricamente pôsto e impôsto pela História, é o dever de responder concretamente à agressão também de uma força que há de ser e tem que ser agressiva, que não pode ser e que não tem condições de ser passiva. Por isso, nós estudantes mineiros, não ficaremos sem resposta a essa agressão, apenas nas palavras e apenas nas notas oficiais. Nós iremos levar ao povo da forma mais objetiva, da forma mais concreta, de forma mais objetiva, da forma mais concreta, de forma mais radical, a resposta a isso tudo. ocorre que é preciso da nossa parte, nós entendemos que é urgente da nossa parte, verificar que não podemos apenas agir na base do sentimento, apenas na base do entusiasmo juvenil, e isso não se põe mais prá nós. Nós agiremos sériamente, nós agiremos conseqüentemente, e somos bastante capazes de agir com a cabeça fria, com a cabeça no lugar, de tal forma que nossas ações tenham prosseguimento e que tenham cabimento e sentido, capazes de contribuir històricamente para mais uma fôrça, capaz de pesar na História em têrmos de mais uma ação nossa, mais uma ação conjunta do povo brasileiro, em busca històricamente da liberdade e da verdadeira democracia, só entendida de seu sentido mais profundo e radical, ou seja, liberdade em todos os campos, liberdade política, liberdade econômica, democracia, também, em todos os campos em em tôdas as áreas. É importante ver como é que essa ofensiva atual do govêrno para a Universidade se manifesta e também em vários outros setores, ou em todos os outros setores. Para os trabalhadores, o arrôcho salarial está impôsto, o arrôcho salarial está aí, matando os trabalhadores dia a dia, quando não matam pelas metralhadoras, quando não matam pelos fuzís diretamente, matam indiretamente, tirando o pão do trabalhador, tirando a comida daquêles que trabalham. E veio depois, paliativamente, demagògicamente, tentar aliciar as questões com o salário mínimo discarado de apenas 23% que não significa nada no orçamento do atual trabalhador brasileiro, que não acrescenta nada no atual orçamento. Em paralelo a isso, a demagogia e o clima de falsidades impôsto e pôsto dentro da Assembléia Legislativa, quando Deputados, contraditòriamente ao que põe para trabalhadores, ganham um aumento, cheio de luxo, de 800 mil cruzeiros por mês. Para acrescentar mais luxo ainda aos seus requintes e para acrescentar ainda mais luxo à sua forma de posição ou de oposição, que para nós não tem mais na Assembléia Legislativa qualquer posição ou qualquer situação, que todos: a ARENA, MDB, Frente Ampla, todos estão casados e acasalados com o Gôverno que hoje comemora o seu 4º ano, de crimes e de violências. É para nós o que vale é a organização e a ação independente do povo, da qual o movimento estudantil procura participar històricamente. Para nós o que vale é a organização e a ação independente do povo capaz de superar a crise, capaz de superar a violência, e capaz de criar no país, que não seja hoje, que não seja amanhã, mas será històricamente, o govêrno livre, o govêrno verdadeiramente democrático, e capaz de trazer a independência total e radical para êsse país. Nós responderemos à violência, nós responderemos à agressão com a busca da liberdade. Apelamos de novo para os senhores pais, para as senhoras mães, para a população de Belo Horizonte, que compreendam a reação e a ação dos estudantes desta altura, de nossa ação se faz em face da reação de um govêrno impôsto por uma política reacionária. A nossa política em face disso, a nosso ver, conseqüentemente tem de ser revolucionária, ou seja, tem que ser capaz de transformar, qualitativamente, o que se põe no país hoje.
REPÓRTER: Jorge Batista, os estudantes mineiros irão às ruas?
JORGE BATISTA: Desde ontem à noite, quando chegou ao conhecimento dos estudantes essa notícia da Guanabara, partimos para tôdas as escolas onde haviam aulas, no caso, Faculdade de Filosofia, ontem à noite, Faculdade de Ciências Econômicas, Faculdade de Direito. Ontem mesmo à noite se fêz uma concentração na Escola de Direito com mais de 400 companheiros presentes tiramos já uma decisão. Decisão no sentido de que hoje, às 7 horas, já estamos em tôdas as salas de aulas das Universidades, informando, a todos os companheiros, bem como a todos os professôres o que ocorreu, e convocando-os para a partir de hoje à tarde trabalharmos no sentido de levar à população de Belo Horizonte, a todos os setores, a todos os cantos, a informação a respeito desse crime. Mas não ficaremos apenas nisso. A partir de hoje, e de hoje mesmo à tarde, partiremos para uma forma de ação de praça pública, capaz de informar ao público o que ocorre, capaz de levar ao público o que ocorre, capaz de levar ao público nosso protesto e o nosso repúdio. Outra questão é que nós achamos importante informar é que dêsde já surgem, efetivamente, solidariedades que se ajuntam às solidariedades ativas do movimento estudantil aos companheiros de Guanabara. Ontem mesmo à noite, senhores do Grupo do Teatro Oficina, que levam no Teatro Marília a peça "Os Pequenos Burguêses", já enviaram nota oficial à Imprensa divulgando sua solidariedade. Mais do que isto, professores, segundo estamos informados, estão sendo signatários de um abaixo assinado que está correndo em tôdas as Universidades, também manifestando o seu repúdio aos fatos. Além disso, a imprensa da Capital, pelos seus militantes, que atuam no movimento estudantil, tem nos procurado, e isto é muito importante, que isto é uma via de comunicação nossa com a população. Agradecemos aos senhores de imprensa nesta oportunidade. Além disso, segundo estamos informados, os intelectuais de Belo Horizonte, escritores, jovens poetas e pintores, também organizam já o tipo de manifestação sintonizada com a manifestação do movimento estudantil. Desta forma o que temos a dizer é que estamos já, dêsde ontem à noite, nos organizando para que as demonstrações sejam as mais fortes possíveis.
REPÓRTER: A ITATIAIA acabou de ouvir as palavras do universitário JORGE BATISTA, Presidente do Diretório Central dos Estudantes de Minas Gerais. Senhoras e Senhores, grato. Muito obrigado, bôa tarde e fiquem com o JORNAL DAS DOZE.
O PRESENTE DOCUMENTO CONFERE COM OS TÊRMOS CONSTANTES DA GRAVAÇÃO DO PROGRAMA LEVADO AO AR ÀS 1200 HORAS DO DIA 29 DE MARÇO DE 1968, PELA RÁDIO ITATIAIA DE BELO HORIZONTE.
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OCTÁVIO AGUIAR DE MEDEIROS – Cel
Encarregado do IPM

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei, muito bom mesmo
Parabens
Jorge Batista

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